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on the shoulders of giants
curadoria de raphael fonseca
24 de junho – 20 de agosto, 2021
nara roesler new york
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Nara Roesler Nova York orgulha-se em anunciar On the shoulders of giants, mostra coletiva com curadoria de Raphael Fonseca, um dos mais aclamados curadores emergentes de arte contemporânea, com abertura em 24 de junho de 2021.
On the shoulders of giants reúne artistas brasileiros de diferentes gerações, cujas produções investigam as relações e tensões presentes nas ideias de tempo e memória. A pluralidade do grupo de trabalhos apresentados, em diferentes linguagens e abordagens, permite uma visão ampliada sobre os temas, propondo uma diversidade de interpretações estéticas e conceituais. A exposição introduz abordagens contemporâneas que, ainda que nos possibilitam compreender como narrativas familiares e ancestrais caminham lado a lado com figuras presentes na elaboração de memórias coletivas.
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on the shoulders of giants
texto de raphael fonsecaÉ preciso admitir a falência: não reconheço o passado e não acredito no futuro. Mas meus pés têm pressa porque errando eu aprendo mais.
Essas duas frases aparecem no final de Doom, vídeo de Randolpho Lamonier e Victor Galvão presente nesta exposição. Sua escrita me chama a atenção pela forma como articulam passado, presente e futuro: não reconhecer o passado não quer dizer ignorá-lo, assim como não acreditar no futuro, não nega que algo está por vir. Na desconfiança entre esses dois extremos, mais vale admitirmos nossa ansiedade e apostar no presente e nos nossos erros.
On the shoulders of giants apresenta trabalhos de artistas que criam sobreposições dos tempos históricos cristalizados pelo pensamento ocidental; diferentes da citação acima, alguns dos autores aqui reunidos reconhecem facilmente o passado e/ou depositam a sua crença no futuro – o que é semelhante a todos é o fato de que as imagens que criaram flertam com a anacronia; a memória individual e coletiva pode se dar a partir de saltos, recordações e esquecimentos.
A máxima latina "nanos gigantum humeris insidentes", comumente atribuída ao nascimento das catedrais e das universidades na Idade Média, aponta para o fato de que, para aprendermos algo, precisamos nos colocar em diálogo e escuta com o passado e com os "gigantes" que nos rodeiam. Alguns desses artistas trabalham a partir da noção de arquivo, elencando e repensando pessoas presentes na memória coletiva e vistas como ídolos.
Há também aqueles que, uma vez sentados no ombro do gigante, se questionam: até que ponto essa figura deveria ser encarada publicamente enquanto tal? Quando o assunto é o antifascismo, degolar o gigante deve ser uma opção. Outros dos artistas aqui apresentados lançam seus olhares a protagonistas de narrativas que se dão em uma esfera privada: as narrativas familiares e ancestrais são percebidas como faróis do aprendizado. A educação, a oralidade e a transmissão de conhecimento entre gerações são centrais em muitos trabalhos que valorizam pessoas anônimas do grande público, mas cujos nomes próprios podem ser muito mais importantes do que qualquer referência bibliográfica. Esses gigantes – por vezes superficialmente enxergados como periféricos e subalternizados – são aqueles que efetivamente guiam grande parcela dos artistas da mostra.
Seja pela pintura, pela utilização de imagens de arquivo, pelo vídeo ou pela exploração das relações entre imagem e palavra, lembremos do que a nossa citação inicial dizia: “errando eu aprendo mais”; em outras palavras, a experimentação é o que guia a maneira como cada um desses artistas elege seus gigantes e se senta sobre os seus ombros. Seus percursos nunca estão pré-definidos e suas viagens de diferentes ritmos são mais de escuta do que de verborragia.
Fica o convite, portanto, para que o público possa compartilhar da efeméride que é essa exposição enquanto os artistas fazem pequenas pausas em suas constantes viagens acima do chão e para além dos limites entre ontem, hoje e amanhã.
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ALAN ADI
A pesquisa de Alan Adi pode se materializar em diversas mídias e formas de ocupação do espaço. Constante em seus interesses é o olhar para as formas como diferentes culturas visuais moldam certas noções de identidade cultural, regional ou mesmo nacional. No trabalho aqui mostrado, o artista dá continuidade às suas pesquisas sobre as relações entre as imagens e a invenção da ideia de Nordeste pelo homem, principalmente a partir do acordeão como símbolo da cultura e identidade popular da região. Narrativas relacionadas à migração, ao preconceito muitas vezes lançado pelo Sudeste e uma singela homenagem à música popular brasileira se misturam nesse trabalho.
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Alan Adi
Sanfona sentida II, 2020
instalação
42 x 285 x 76 cm -
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GABI BRESOLA
A relação entre imagem e palavra é um interesse central na produção de Gabi Bresola, especialmente no que diz respeito à produção de publicações. Nascida e criada em Joaçaba, interior de Santa Catarina, a artista tem pais agricultores e algumas das diferenças de suas vivências e o estranhamento que ser uma artista visual causa em sua família são alguns dos motores de sua pesquisa. Em Nostalgia europeia no novo mundo, a artista cria um encontro entre cartões postais de cidades europeias e suas ‘correspondentes’ cidades catarinenses fundada por imigrantes, portando, muitas vezes, os mesmos nomes. Em que medida é possível transpor a cultura visual e a identidade europeias para o novo continente? Até onde os nomes dessas cidades e o desejo de forjar uma nova Europa na América do Sul contribuem para o racismo neste estado?
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Gabi Bresola
Nostalgia europeia no novo mundo, 2020
postais impressos em offset 240g em display de acrílico -
Gabi Bresola
Nostalgia europeia no novo mundo, 2020
postais impressos em offset 240g em display de acrílico
2 peças de 10 x 15 cm -
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GUSTAVO CABOCO
O trabalho de Gustavo Caboco tem lidado frequentemente com o seu aprendizado sobre os Wapichana, povo indígena que vive na comunidade Canauanim, em Cantá, Roraima, onde sua mãe nasceu. Nascido e criado em Curitiba, o artista tem aprendido com seus parentes e ressignificado a sua própria identidade enquanto pessoa e artista. Por meio do desenho e da pintura, ele propõe imagens onde o corpo humano é torcido, fragmentado e transformado em diversos outros elementos. Essas narrativas são permeadas de transformações e tendem a convidar o público a também refletir sobre suas próprias ancestralidades. Isso é trazido tanto no título da série de desenhos em exibição, quanto na ação das figuras: corpos que estão a “plantar bananeira”, ou seja, a ficar de cabeça para baixo sempre conectados com o chão, com suas raízes.
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Gustavo Caboco
série “a lágrima da paisagem ancestral”, 2020
caneta branca sobre papel
10 peças de 29,7 x 21 cm -
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LEILA DANZIGER
Com uma pesquisa que estende pelas últimas três décadas, os trabalhos recentes de Leila Danziger giram em torno de arquivos, bibliotecas e imagens geralmente coletadas dentro da esfera de sua família e seu processo de imigração da Alemanha para o Brasil no começo do século XX. Sua mãe trabalhou como professora durante toda a sua vida
e, ao encontrar um álbum de sua formatura como professora, a artista criou uma série de trabalhos chamado Pesquisa escolar. Usando etiquetas facilmente encontradas em papelarias, o trabalho se apresenta como uma espécie de atlas tanto de pessoas que são essenciais para a educação, mas muitas vezes eclipsadas – como Martin Luther King, Carolina Maria de Jesus e Beyoncé –, quanto de pessoas execráveis, mas presentes especialmente na educação primária da artista – como as figuras relacionadas à ditadura militar no Brasil. -
Leila Danziger
Alda, Dalva, Carolina # 2, da série pesquisa escolar, 2021
carimbo (tinta gráfica) sobre etiqueta e cartão
50,5 x 76 cm -
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RANDOLPHO LAMONIER (E VICTOR GALVÃO)
A pesquisa de Randolpho Lamonier geralmente se usa de elementos tidos como baratos e/ou mesmo reaproveitados como pedaços de tecido e objetos de plástico. Por meio da costura, o artista vai criando “panos” onde oferece ao público narrativas que tanto podem se colocar de forma profética quanto ao futuro, quanto também pensar suas vivências na cidade industrial de Contagem, em Minas Gerais. Nos trabalhos a serem apresentados, o olhar do artista se apresenta de forma mais abstrata, com um trabalho em tecido ocupado por diversos objetos geralmente vistos como baratos. Fazendo um par com esses objetos, há um vídeo feito em parceria com Victor Galvão onde ambos se colocam ansiosos perante o futuro e criam uma narrativa majoritariamente feita com animação stop motion.
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Randolpho Lamonier
Minha vó me ensinou a agulha como metáfora do perdão, da série Do pouco que eu sei, 2021
cordas, serigrafia, costura,
bordado e pintura sobre tecido
218 x 160 cm -
Randolpho Lamonier and Victor Galvão
DOOM, 2021 [fragment]
video, full HD, color, stereo sound
4’55”
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ANDRÉ GRIFFO
A pesquisa de André Griffo é voltada para a pintura e suas relações históricas com a representação da arquitetura. Longe dos grandes discursos panfletários, o artista nos convida a dar atenção aos mínimos detalhes de suas imagens que refletem as muitas violências que dão corpo às narrativas relativas às histórias do Brasil e suas ruínas.
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André Griffo
O fim condizente com o começo 3, 2021
tinta óleo sobre tela
177 x 223 cm -
André Griffo
O vendedor de miniaturas 2, 2021
acrílica e óleo sobre tela
177 x 133 cm -
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ANDRÉA HYGINO
Com uma pesquisa voltada para a gravura, Andréa Hygino realizou uma série de trabalhos que pensam não apenas a sua relação com a educação, mas também a de sua mãe. Ambas são professoras e, durante a sua vida, a artista sempre prestou atenção na mesa e cadeiras utilizadas pela mãe para dar aulas particulares em casa. Nascem, portanto, trabalhos que encaram essas bases de madeira como matrizes de xilogravura; suas muitas camadas do tempo são transpostas para o papel. A exposição inclui também uma série mais recente, em que a artista reimagina o design das cadeiras dos alunos, levantando questões sobre sua funcionalidade: e se, em alguns casos, seu aspecto impedisse as formas convencionais de ensino ao invés de incentivá-las? Que limitações são intrínsecas aos móveis e quais são os privilégios subjacentes ao seu uso?
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Andréa Hygino
Ambidestra, da série Protótipos Inadequados, 2021
madeira pinus
40,2 x 29 x 31,7 cm -
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FILIPE LIPPE
Filipe Lippe é um colecionador de fotografias que tem um caráter histórico: guerras, imagens de políticos, encontros de estado, tomadas de posse, discursos públicos; atenção é dada a diversos tipos de registros. Junto a isso, há um interesse do artista também pelas imagens que registram pessoas tidas como anônimas – sua família, negros escravizados durante o século XIX no Brasil, fotografias de diferentes povos originários do Brasil. A partir desse arquivo, o artista propõe novas imagens em que, a partir de sua grande capacidade imitativa, são propostas pequenas intervenções nas composições que pervertem o desejo documental inicial das fotografias. Novas histórias são, portanto, escritas, rasuradas e propostas ao público.
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ADRIANO MACHADO
As relações entre imagem, memória, família e ficção são alguns elementos que interessam a Adriano Machado. Em seu mais recente vídeo intitulado Fé e mistério, presente na exposição, acompanhamos o pai do artista no processo de produção de um instrumento de ferro que se assemelha a uma lança. Tendo tido uma experiência com seu pai nessa oficina, Machado produziu uma série de objetos em madeira e ferro. Os dispositivos criados não foram concebidos para um uso específico, mas sim para representar o próprio processo de tentativa e erro, revelando a imprevisibilidade da experiência de uma produção que surge do aprendizado e admiração pelo trabalho de seu pai.
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Adriano Machado
Instrumento utópico 01, 2021
bronze e ferro fundido
3 x 6 cm -
Adriano Machado
Fé e Mistério, 2014
video, color, HD, 16:9
2’14”
Courtesy of the artist, Galeria Nara Roesler and Galeria Kogan Amaro.
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NO MARTINS
A partir da pintura, No Martins tem produzido nos últimos anos uma série de imagens contundentes que explicitam tanto o racismo estrutural, quanto seu engajamento com a luta antirracista. Em sua nova série chamada Encontros políticos, o artista traz imagens de pessoas negras a conversar e interagir entre si em espaços públicos como praias e grandes metrópoles. O simples ato de estar junto, de conversar e de transmitir conhecimento pela fala perante o olhar público se configura como um encontro com potência política.
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No Martins
Sem título (Série: Encontros Políticos), 2021
tinta acrílica sobre tela
280 x 200 cm -
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VIRGINIA DE MEDEIROS
Na série Alma de bronze, Virgínia de Medeiros prossegue com sua pesquisa baseada na residência, convívio e troca com pessoas de diferentes grupos sociais, desejos existenciais e formas de se manter vivas. A artista residiu na Ocupação Hotel Cambridge e se tornou parte das lutas lideradas por Carmen Silva Ferreira no Movimento dos Sem-Teto do Centro. Próxima das lideranças feministas da Frente de Luta por Moradia, a artista realizou uma série de retratos das mulheres que são moradoras da Ocupação 9 de Julho. O último desses retratos é o mostrado na exposição, onde a grande Carmen protagoniza a imagem com toda sua família ao redor. As expressões das pessoas para a câmera transparecem sua confiança na luta pela moradia e na permanência desse engajamento nas gerações futuras de sua família.
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Virginia de Medeiros
Carmen Silva Ferreira, Guerrilheiras, da série Alma de Bronze, 2017
impressão jato de tinta em Hahnemühle Photo Rag 308
90 x 60 cm -
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MARTA NEVES
O humor e o olhar ácido para o sistema de artes visuais no Brasil são elementos constantes na produção de Marta Neves. Na sua série de trabalhos chamada de Não-ideias, a artista encomenda faixas que trazem para o espaço expositivo ou para o espaço público narrativas de fracasso e não execução de ações com nomes de pessoas desconhecidas. Dessa forma, a artista convida o público a imaginar quem são aquelas pessoas, porque suas “ideias” não foram executadas e quais seriam os próximos passos desses personagens em suas vidas. Em Éden, por sua vez, Neves reúne a linguagem da fotografia de família com a temporalidade do vídeo, permitindo-nos mergulhar nas nuances das relações que normalmente ficam de fora da imagem. -
Marta Neves
Da série NO IDEA, 2020
faixa pintada à mão
unique + exhibition copy
70 x 500 cm -
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AMADOR E JR. SEGURANÇA PATRIMONIAL
A performance e sua interseção com a noção de trabalho é o campo central da dupla/empresa Amador e Jr. Segurança Patrimonial. Como o público reage ao perceber que os corpos dos seguranças que resguardam a integridade das obras de arte em uma exposição são os corpos dos próprios artistas? Quanto a seus desenhos, eles reúnem tanto o que já foi realizado, quanto aquilo que ainda pode vir a ser feito, estas imagens se colocam, portanto, entre o arquivo e o projeto, o passado e o futuro.